quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Escritores & Tal

Só por um instante

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Posted by on 11 set 2011 in Blog | 0 comments
Owl Clock

Bum. Bum. Bum. Bum. O socador golpeia o chão compactando o solo bum bum bum bum. A poeira cinzenta cobre as botas cinzentas sem cadarços sem meias as pernas magras mergulham nas calças desbotadas, os joelhos dobram, esticam e bum bum bum bum as mãos ressecadas pelo cimento, calejadas pela madeira das hastes do socador que bum bum bum bum a camisa bem gasta aberta no peito que se contrai e distende enquanto o socador bum bum bum bum a cabeça que levanta deixando ver o rosto e bum. O socador pousa na terra, a mão segura a ponta da camisa, passa no rosto enxugando o suor.
E ela vê então o pedreiro, mas só por um instante, um ínfimo instante.
Aperta o passo atravessa a rua as pessoas indo e vindo, as fachadas das lojas, as placas, os pontos de referência, está com pressa, não sabe direito o caminho. Perde-se.
Perde a hora. Perde a urgência, se senta na tora de madeira embaixo da árvore.
E bum… bum… bum… bum… Deixa a moça ela tá descansando e bum… bum… bum… Menino, para de mexer aí e bum… bum… bum… e o ônibus parou e abriu a porta e alguém subiu dando bom dia ao cobrador. Será que tá passando mal? e bum… bum… tá tá tá tá tá tá tá o martelo na madeira desmontando o tapume.
O cheiro da rua é forte, mistura de esgoto com fruta, verdura, carne, suor, óleo diesel, flores, suspira e bum sumiu tudo, tudo parou, o silêncio zumbindo ao redor.
Foi tanto tempo, foi quase nada, e Bum. Bum. Bum. Bum.
Está atrasada, abre os olhos, levanta, atravessa a rua, caminha alguns passos, reconhece a fachada da loja, sobe as escadas, apanha o relógio que deixou no conserto.
Coloca no pulso, desce os degraus lentamente, agora tem tempo. Tic. Tac. Tic. Tac. Tic. Tac. Tic. Tic. Tic. Tic.
Merda. Parou outra vez.